domingo, 4 de janeiro de 2009

QUANTOS VEREADORES DEVEM COMPOR UMA CÂMARA?

O tema parece mais uma intriga da corte, pouca gente se interessa por ele, apesar de a imprensa noticiar, com detalhes e furos de reportagem, a contenda entre o Senado e a Câmara dos Deputados, em torno de uma emenda constitucional que criaria alguns milhares de novos cargos de vereador, ampliando a composição de um punhado de câmaras municipais.
O descaso em relação às notícias veicula uma mensagem do povo: isso é coisa deles, lá em cima, não temos nada que ver com isso.
E para variar, o povo tem razão. As duas correntes que se enfrentam, nesse caso, defendem, no fundo, no fundo, a mesma tese: a democracia representativa implica, na visão deles, necessariamente, o estabelecimento de uma casta privilegiada, a dos “representantes”, aos quais se atribuem privilégios de monta, bancados pelos impostos extorquidos à população (já se provou e comprovou que quem paga impostos, mesmo, são as classes populares, uma vez que os tributos estão incluídos nos preços de tudo o que elas consomem).
O que “eles”, lá em cima, discutem é se o tamanho da casta deve ser maior ou menor. Se continuar como está, os defensores dessa ideia se sentem mais seguros politicamente e não querem que se mexa num jogo em que eles estão ganhando. A ampliação interessa aos que ainda precisam de alguns lances para consolidar sua posição hegemônica no contexto eleitoral – alguns cabos a mais fazem a diferença.
Em nenhum momento se vê uma reflexão séria sobre o sentido dessa tal representação popular. O discurso pode ser até recheado de algumas afirmações nessa linha, mas é pura balela, são frases de efeito, sem nenhum conteúdo.
O avanço no processo político exige que se considere uma outra possibilidade, que não essa, já esgotada, de uma estrutura de poder fundada na fraude eleitoral e que, por ser centralizadora, possibilita a corrupção. O político “despachante”, ou seja, aquele que frequenta os corredores e antessalas do poder executivo, para liberar verbas, para conseguir benefícios para suas bases, é o mesmo que negocia os esquemas fraudulentos que volta e meia são escancarados pelas investigações policiais (mas não acabam nunca, essas “operações” apenas tentam esvaziar o mar com canequinhas).
É preciso pensar em novas formas de exercício do poder.
Uma delas é a democracia participativa (superando a representativa). Alguns ensaios já vem sendo feitos, com bons resultados. É preciso aprofundar essa tese, experimentá-la mais e mais, aperfeiçoá-la – também participativamente. Não se pode manter o atual esquema em que se designam cachorros para tomar conta da lingüiça. É preciso ampliar as discussões a respeito dos problemas coletivos e criar canais de manifestação autêntica das opções da própria coletividade. Sem isso, toda nossa estrutura jurídica e administrativa só evolui na direção da manutenção de privilégios aos já privilegiados.
Outra possibilidade é o esvaziamento do poder de barganha dos “representantes”, ampliando radicalmente o número deles. No mínimo, multiplicar por dez a composição atual. Uma cidade, por exemplo, que tenha 11 vereadores, passaria a ter 110. Qualquer negociação escusa teria que ser feita com muito mais gente, com riscos muito maiores para os delinqüentes. Maior número de setores da sociedade teriam sua voz nesse parlamento ampliado, o que poderia contribuir, em muito, para a legitimidade do poder.
Isso ficaria muito caro, diriam. Não necessariamente. É possível, por exemplo, congelar o orçamento do legislativo, mantendo os níveis atuais. Não haveria remuneração para o exercício da vereança. Os recursos financeiros atuais seriam utilizados para garantir a infraestrutura necessária, diferente da que existe hoje, sem essa de gabinetes e assessores, veículos, franquias de correio e telefone, passagens e diárias.
As forças populares que sustentam o mandato tratariam de viabilizá-lo, cabendo ao eleito o papel de se legitimar como liderança, estreitando contato com suas bases e colocando a militância a serviço da eficácia da representação.
É no meio do povo que deve ficar o tal “gabinete”, não no palácio. São os representados que devem assessorár. Mais, é com eles que devem ser discutidas as posições a serem assumidas no jogo político.
A rigor, esse tipo de representação ampliada seria uma forma e um caminho para se chegar à democracia participativa. Não elimina todos os problemas que ocorrem hoje, como por exemplo, o poder de fogo do empresariado. Não faltaria, com certeza, algum ricaço que se dispusesse a financiar o legislador, em troca de apoio aos interesses de seus negócios. Mas com o poder pessoal do vereador diluído, sua “compra” ficaria menos vantajosa.
É uma ideia. Que venham outras! O que não dá é para suportar, por muito mais tempo, esses caras cuidando de seus próprios interesses e arvorando-se em portavozes dos nossos, em deslavada mentira.

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